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A Teoria Evolucionista de Lamarck

Por: Isabela T. M. (Bióloga e Professora de Biologia)

Última atualização em 04/06/2025

Introdução

Imagine um mundo onde as espécies de seres vivos eram vistas como peças fixas de um quebra-cabeça elaborado pelo divino: sempre imutáveis e eternas. Foi nesse cenário, ainda preso às correntes do pensamento fixista (essa ideia de que tudo nunca vai mudar; sempre foi assim e sempre será), que surgiu Jean-Baptiste de Lamarck, uma mente inquieta que ousou pensar diferente de todos da sua época – É sobre esse cientista polêmico que vamos falar hoje! 

Figura 01. Jean-Baptiste Lamarck

Quem foi Jean-Baptiste Lamarck?

Nascido em 1º de agosto de 1744, na pequena vila de Bazentin, na França, Jean-Baptiste Lamarck inicialmente se alistou no exército, mas logo “pendurou as botas” e mergulhou com tudo no universo encantado da ciência. Apaixonado por botânica e zoologia, conquistou espaço no renomado Museu Nacional de História Natural de Paris, onde brilhou como professor de invertebrados (um termo que, aliás, foi ele mesmo quem criou).

Lamarck foi um dos primeiros a usar o termo “biologia” no sentido moderno. Sua principal obra, a “Filosofia Zoológica” (de 1809), é uma verdadeira joia rara da ciência, na qual ele apresenta uma proposta bem ousada e super polêmica para a sociedade da época: os seres vivos mudam ao longo do tempo (algo que, no futuro, ficaria conhecido como “evolução“).

No final, Lamarck correu quase cego, pobre e ignorado, em 28 de dezembro de 1829, mas sua ousadia científica ecoa até hoje; pois, por mais que suas ideias foram refutadas posteriormente (como vemos em “A Teoria Evolucionista de Darwin”), seus pensamentos foram o ponta pé para romper com as ideias fixistas de antigamente e abrir caminho para, de fato, conhecermos a biologia e a evolução da vida na Terra.

A Teoria de Lamarck: Vida em Constante Movimento

A teoria evolucionista de Lamarck (ou simplesmente Lamarquismo) é como uma sinfonia da adaptação. Em sua essência, ela defende que os seres vivos não foram criados prontos, mas sim moldados pela vida.

 
Os Dois Pilares do Lamarquismo:
  1. A Lei do Uso e Desuso:
    Essa ideia diz, basicamente, que se um órgão é usado com frequência, ele se fortalece, se desenvolve e cresce. Mas se cai em desuso… Ah, aí ele enfraquece e pode até desaparecer! Tipo como músculos que definham na ausência de exercício, ou olhos de animais que vivem nas cavernas (que se tornam inúteis ali); acabam virando apenas vestígios.

  2. A Lei da Herança dos Caracteres Adquiridos:
    Aqui está a cereja do bolo de Lamarck (e o motivo do porquê, hoje em dia, o coitado muitas vezes é tão zoado): tudo aquilo que um organismo adquire ao longo da vida, em resposta ao ambiente, seria passado para seus descendentes. Como se a experiência da vida de um indivíduo esculpisse o seu corpo e deixasse uma “herança” biológica destas mudanças para as próximas gerações. 

Para facilitar a nossa compreensão destes pilares, vamos analisar o exemplo que o próprio Lamarck utilizava: As girafas. Bem, segundo ele, originalmente as girafas tinham pescoços curtos (e seriam bem parecidas como cavalos). Mas de tanto se esticarem para alcançar as folhas das árvores mais altas, elas acabaram desenvolvendo pescoços mais longos (bem longos) e fortes, passando essa “herança” ou traço adquirido para os seus filhotes.

Trazendo outros exemplos: poderíamos, segundo Lamarck, observar a Lei do Uso e Desuso e da Herança dos Caracteres Adquiridos em atletas. Imagine um atleta de tênis, destro e que sempre utiliza o braço direito para jogar. Se as Leis de Lamarck fossem verídicas, esse atleta teria o seu braço direito muito bem desenvolvido e forte e, caso tivesse filhos, seus filhos nasceriam com o braço direito mais desenvolvido e forte que o esquerdo, visto que seu pai adquiriu (ao longo de sua vida) tal característica. Outro exemplo seria a coloração capilar: Imagine que uma pessoa decidiu pintar o cabelo dela de rosa. A cor natural do cabelo desta pessoa (ou seja, a cor com a qual ela nasceu) é preto, mas para Lamarck, se essa pessoa tiver filhos após a coloração, seus filhos poderiam nascer com o cabelo rosa (já que ela adquiriu tal traço). Entendeu? 


A Polêmica e Os Limites dos Pensamentos de Lamarck

Ah, vai, aqui eu vou passar um paninho bem de leve pro Lamarck, pois vejo que muitas pessoas o criticam severamente como se ele fosse um tolo que não enxergou o óbvio. 

Bem, com o surgimento da genética e da biologia molecular, descobrimos que características adquiridas (como músculos desenvolvidos, cores de cabelo, tatuagens, ou cicatrizes, por exemplo) não alteram o DNA e, portanto, não são passadas adiante. Em palavras mais bonitas, podemos dizer que características que alteram a nossa estrutura física, mas não o nosso genoma (nossa estrutura genotípica), não são capazes de passar adiante para novas gerações. É por isso que, se você é loiro(a) e pinta seu cabelo de preto, por exemplo, seus filhos ainda têm chances de nascer com o cabelo loiro, pois a sua definição genética (ou seja, os seus genes) carrega a informação para cabelos loiros. 

Isso deixou a teoria de Lamarck em maus lençóis do ponto de vista científico moderno, levando a Lamarck ser muitas vezes menosprezado por estudantes e por cientistas no mundo todo. Mas isso não significa que ele estava totalmente errado. Na verdade, Lamarck teve o mérito colossal de ser um dos primeiros a enxergar a vida como um processo de transformação. Pois é, foi ele um dos pioneiros a ir contra a maré, desafiando pensamentos fixistas e, muitas vezes, religiosos que imperavam na época, abrindo alas para que a ciência pudesse chegar ao conhecimento da evolução e do pensamento evolucionista. Inclusive, há estudos modernos em epigenética que resgatam algumas ideias parecidas com as de Lamarck, mostrando que certos traços podem, sim, ser influenciados por fatores ambientais e transmitidos de maneira não convencional. Um lampejo de redenção para o nosso velho pensador!

Mesmo que superada, a teoria de Lamarck é fundamental para entendermos o desenvolvimento do pensamento científico. Estudar Lamarck é mais do que rever teorias antigas. É homenagear a coragem intelectual, é entender que o conhecimento não nasce pronto, mas cresce, muda, se adapta… Exatamente como os seres vivos!


Referências Bibliográficas

LAMARCK, JEAN BAPTISTE PIERRE ANTOINE. Filosofía zoológica. Editora Unesp, 2022.

UZUNIAN, A.; BIRNER, E. Biologia: volume único. 3a ed. São Paulo: Harbra, 2008.

AMABIS, J. M. & MARTHO, G. R. Fundamentos da Biologia Moderna. Volume único. Editora Moderna, 4° edição. São Paulo, 2006.