Filo Cnidaria: Cnidários - Características, Estruturas e Reprodução

Por: Isabela T. Meyer (Bióloga e Professora de Biologia)
Última atualização em 23/04/2025
Introdução
Se você já mergulhou em águas tropicais, passeou por um aquário ou simplesmente se encantou com as imagens vibrantes da vida marinha, com certeza já topou com algum representante do filo Cnidaria. Mas quem são esses seres de nome esquisito?
Os cnidários ou celenterados são animais fascinantes que habitam os mares do mundo todo, com alguns até em águas doces. Nesse grupo, a beleza muitas vezes vem com um toque perigoso: estamos falando das águas-vivas, anêmonas-do-mar, corais e caravelas-portuguesas. Criaturas que, apesar da fragilidade e delicadeza aparente, escondem um verdadeiro arsenal microscópio; um presente da evolução para a sua autodefesa ou alimentação.
Como é a Anatomia dos Cnidários?
Apesar de não possuírem cérebro, coração ou órgãos complexos como os nossos, eles são cheios de adaptações de grande eficiência. São animais diblásticos, onde a parede do corpo desses animais composta por apenas duas camadas de células: a camada de epiderme (que reveste o animal externamente) e a camada gastroderme (que o reveste internamente na cavidade digestória), separadas por uma substância gelatinosa chamada mesogleia, que dá certa sustentação ao animal e sem precisar de ossos. Agora, em relação à anatomia externa, o seu corpo é basicamente dividido em duas formas principais: a forma pólipo e a forma de medusa.
A forma pólipo é muito marcante nos corais e nas anêmonas, caracterizada basicamente por ser uma estrutura que lembra a forma de um cilindro. São normalmente sésseis (ou seja, fixos e sem locomoção), mas algumas espécies conseguem se locomover deslizando lentamente no substrato em que se encontram.

Já a forma de medusa, é muito visível nas águas-vivas, por exemplo. Ela lembra um guarda-chuva, onde a boca do animal está presente na posição que ficaria o cabo desse “guarda-chuva”. Além disso, podemos ter estruturas em tentáculos, sendo estes mais longos ao redor da boca e mais finos nas extremidades, nas bordas do corpo do animal. Aqui é importante dizer que determinadas espécies de cnidários apresentam ambas as formas (pólipo e medusa) a depender do estágio de desenvolvimento em que estão (como, por exemplo, a classe Hydrozoa).

O Toque Venenoso
Se você nunca teve o desprazer de ir à praia e receber um abraço uma água-viva ou uma caravela-portuguesa (por exemplo), você é muito sortudo(a)! Pois uma das características que distinguem esses animais dos demais é a presença dos cnidócitos. Os cnidócitos são células presentes nos tentáculos e ao redor da boca desses animais que apresentam uma bolsa interna chamada de nematocisto, onde encontra-se uma espécie de “fiozinho” longo e oco que fica ali dentro enroladinho. Quando esses animais precisam se defender ou se alimentar, o nematocisto expele rapidamente esse “fiozinho”, que dá uma espécie de chicoteada liberando substâncias tóxicas (que chamamos de substâncias urticantes) ferindo a sua vítima.
Então, quando você for à praia e tiver alguma sinalização da presença desses animais, é bom evitar entrar na água. Na maioria das vezes o machucado é local e não oferece grandes riscos ao ser humano, porém existem espécies que podem, sim, “cancelar o CPF” do ser humano; então é bom não vacilar.
Mas e o Peixe-Palhaço? Como o Peixe-Palhaço Consegue Encostar nas Anêmonas?
Nosso querido Nemo desenvolveu uma adaptação muito interessante: ele produz um muco que reveste o seu corpo e o protege das toxinas liberadas pelas anêmonas. Essa adaptação fantástica permitiu que essas duas espécies desenvolvessem uma relação simbiótica, onde ambos conseguem se beneficiar: o nemo estimula o fluxo de água facilitando a alimentação da anêmona, além de remover restos de alimentos que ficaram para trás; e a anêmona oferece proteção a ele contra predadores. No final das contas essa amizade foi ótima para a sobrevivência dos dois (se você quiser saber um pouco mais sobre como os animais se relacionam na natureza, veja nosso artigo “Relações Ecológicas: O Que São e Quais os Tipos?“).


A Fisiologia dos Cnidários
Sistema Digestório
Os cnidários têm um sistema digestório bem diferente do nosso. Eles possuem uma cavidade gastrovascular, que funciona tanto para digestão quanto para circulação de nutrientes. Além disso, em vez de terem um tubo digestivo completo (ou seja, com entrada e saída diferentes = com boca e ânus), eles possuem uma única abertura, que serve para ingerir alimentos e também eliminar resíduos. A digestão destes bichos ocorre em duas etapas:
Digestão extracelular: aqui, enzimas são liberadas na cavidade gastrovascular e começam a quebrar o alimento;
Digestão intracelular: depois, as células da parede da cavidade finalizam a digestão e absorvem os nutrientes.
Sistema Circulatório
Esses bichos, ao contrário dos vertebrados, não têm coração, vasos sanguíneos e nem sangue. Em vez disso, os nutrientes e gases se espalham pelo corpo por difusão direta. Aqui, a própria cavidade gastrovascular atua, também, como um “meio de transporte interno”, distribuindo o alimento digerido para todas as partes do corpo. Como esses animais são bem pequenos e têm o corpo fino, esse processo já dá conta do recado.
Sistema Respiratório
Os cnidários também não têm pulmões ou brânquias. “Uai, mas aí como que acontece a respiração?” você pode estar se perguntando. Bem, aqui a respiração acontece por difusão direta através da pele (ou melhor, da epiderme). Isso significa dizer que o oxigênio da água entra pelas células da superfície do corpo, e o gás carbônico sai do mesmo jeito. Por serem animais aquáticos, e com o corpo repleto de água internamente, essa troca gasosa já é suficiente.
Sistema Nervoso
Se eu te disser que cnidários têm cérebros, você acreditaria? Que bom que não, porque, de fato, esses animais não têm cérebros. Mas você acha que as águas-vivas são “burras” por esse motivo, pense de novo. Embora realmente não possuam um cérebro central, os cnidários contam com um sistema nervoso em forma de rede difusa, chamado de rede nervosa difusa. Essa rede está espalhada por todo o corpo e permite que eles:
Reajam a estímulos do ambiente (luz, toque, etc.);
Nadem (principalmente nas formas medusoides, como a água-viva);
Controlem seus tentáculos e mecanismos de defesa.
Alguns cnidários, como as águas-vivas, têm estruturas sensoriais especializadas chamadas estatocistos (que ajudam no equilíbrio) e ocelos (que percebem luz). Pra quem não tem nem cabeça, até que não está nada mal, não é mesmo?

A Reprodução e o Ciclo de Vida dos Cnidários
Esses animais podem se reproduzir tanto de forma solitária (assexuada) ou em dupla (sexuada).
Quando falamos da reprodução assexuada, estamos falando principalmente das espécies que têm como forma anatômica de pólipo. Neste caso, normalmente ocorre por brotamento, em que novos indivíduos nascem como ramificações do corpo principal.
Já na reprodução sexuada, destacam-se os animais com formas de medusas: aqui rola um verdadeiro baile, onde os gametas são liberados na água e ocorre a fecundação. O zigoto dá origem a uma larva chamada plânula, que nada livremente por um tempo até se fixar em algum lugar e formar um novo pólipo que, por sua vez, pode gerar novas medusas (conforme mostra a figura 5., ao lado).
Mas, Afinal: Qual a Importância dos Cnidários?
Além de todo esse espetáculo de formas, cores e estratégias de sobrevivência, os cnidários têm um papel crucial nos ecossistemas marinhos. Os recifes de corais, por exemplo, são formados por minúsculos pólipos e servem de abrigo e berçário para milhares de espécies, como verdadeiras cidades submersas pulsando vida. Para além disso, os cnidários não só ajudam a controlar populações (exercendo o papel de predadores, por exemplo), como também servem de alimentos para diversas criaturas aquáticas. E, como se já não fosse suficiente, esses animais ainda têm grande utilidade para nos indicar a qualidade da água. Isso ocorre principalmente com os corais, por meio das alterações nesses animais nós conseguimos ter uma noção de como está a qualidade da água naquela região (poluição, temperatura, pH). Isso porque são animais muito sensíveis e de rápida resposta ao ambiente externo. Não é à toa que hoje temos os corais como grandes aliados nos estudos de impactos ambientais e projetos de conservação.
Se você tem interesse em conhecer mais sobre o mundo dos invertebrados, confira a nossa página Zoologia de Invertebrados e explore mais dos nossos conteúdos. Até Breve!
Referências Bibliográficas
BECERRA, A. J. J. Evolução do veneno em cnidários. Tese de Doutorado. Universidade de São Paulo, 2021
LEÃO, Z. M. A. N.; KIKUCHI, R. K. P. de; OLIVEIRA, M. de D. M. Branqueamento de corais nos recifes da Bahia e sua relação com eventos de anomalias térmicas nas águas superficiais do oceano. Biota Neotropica, v. 8, p. 69-82, 2008.
AMABIS, J. M. & MARTHO, G. R. Fundamentos da Biologia Moderna. Volume único. Editora Moderna, 4° edição. São Paulo, 2006.